Em Paragominas, município que foi um dos 10 principais desmatadores do
bioma, pecuaristas fizeram pacto pelo desmatamento zero, mas Globo Rural
flagrou problemas na região.
Por Globo Rural
Paragominas esteve
entre os 10 municípios que mais desmataram a Amazônia
O Globo Rural voltou à região de Paragominas, no
Pará, 5 anos depois da última visita, para conferir a atividade agropecuária da
região que faz parte da Amazônia Legal.
Há cerca de 10
anos, a cidade fazia parte de uma lista negativa do Ministério do Meio Ambiente
por ser uma das principais desmatadoras da floresta amazônica.
Com esforço do
poder público, população local, agricultores e pecuaristas, Paragominas
conseguiu sair das primeiras posições do ranking de devastação e hoje serve
como modelo de recuperação ambiental. Mesmo com toda mobilização, os crimes
ambientais continuam.
O passado
Paragominas é uma homenagem a três estados:
Pará, Minas Gerais e Goiás. Foi de onde vieram os primeiros pecuaristas e
agricultores para ocupar esse município localizado na Amazônia.
A região chegou a
ter 300 serrarias em atividade, destruiu 45% da mata nativa do seu território,
879 mil hectares de floresta, uma área do tamanho da região metropolitana de
São Paulo.
Um desmatamento que
trouxe consequências para o agronegócio. O presidente do Sindicato Rural de
Paragominas, Murilo Zancaner, explica que a venda de soja foi embargada por
causa dos problemas ambientais do município.
O que acontece hoje
O primeiro problema
que a equipe localizou nesta volta à cidade foi o desmatamento de 100 hectares
de floresta amazônica. A imagem de satélite feita em maio de 2018 mostrava uma
área densa de árvores, só que, mais de um ano depois, praticamente não sobrou
quase nenhuma árvore em pé.
O secretário
municipal de Meio Ambiente, Felipe Zagalo, diz que autorizou o dono da fazenda
a arrancar a vegetação porque se tratava de uma área que já foi desmatada no
passado.
Já para a diretora
de fiscalização da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará, Andréia
Coelho, foi desmatamento ilegal. Ela afirma que haverá punições para o produtor
rural.
"Nós
elaboramos um relatório, para que essa área seja definitivamente
embargada", diz Andréia.
O Globo Rural tentou contato com o proprietário da
fazenda, não houve retorno.
Madeira sem documentação
Outro problema foi
encontrado nas rodovias da região. A reportagem percorreu as estradas durante a
noite para ver se havia caminhões transportando madeira de forma ilegal.
Não precisou muito
e foi encontrado um caminhão quebrado. Na carroceria dele estavam 11 toras de
roxinho, uma madeira nativa cobiçada pela cor e durabilidade.
Questionado, o
motorista não tinha a documentação das madeiras e não soube responder sobre a
origem do produto.
Caça de animais silvestres
Na manhã seguinte,
mais um flagrante, desta vez em terra indígena. Agentes do Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama),
Fundação Nacional do Índio (Funai) e policiais federais apreenderam três motos,
um caminhão, carne de tatu silvestre e 50 toras de madeira.
O flagrante
aconteceu na aldeia do povo indígena Tembé, que tem 280 mil hectares, onde
vivem cerca de 500 famílias, mas 70% desse território já sofreu algum tipo de
dano ambiental.
O porta-voz da
etnia, Valdecir, reclama da falta de apoio na fiscalização da área.
"Hoje, esse apoio (do governo federal) é praticamente é zero. Ele não existe, a gente tem se mobilizado, nós indígenas, com os nossos próprios guerreiros", afirma.Cemitério de árvores
Nas margens da
terra indígena, bem na divisa da área protegida, um exemplo do avanço do
desmatamento. Lá está localizado um cemitério de árvores. As marcas nos troncos
revelam houve queimadas. Há capim plantado e, aos poucos, a mata vai dando
lugar para a pastagem.
Foi possível
perceber que os criminosos estão derrubando e cortando as árvores no mesmo
local. Na área, o Globo Rural encontrou uma
árvore com pelo menos 40 metros de altura derrubada neste cemitério.
Busca pela preservação
Como são crimes
ambientais sem solução, ainda não é possível dizer quem são os responsáveis e
se eles têm ligação com o agronegócio.
O que se sabe é
que, após o pacto entre produtores rurais e população, Paragominas conseguiu
reduzir a área desmatada em 9 anos de 7 mil hectares para 1,8 mil hectares por
ano.
De janeiro até
setembro, o município já aplicou R$ 13,8 milhões em multas por crimes
ambientais e embargou mais de 2 mil hectares. Um trabalho que deu a cidade o
título de "município verde".
"Nós fizemos um pacto pelo desmatamento zero, tiramos o pessoal que estava aqui só para explorar a região, tirar madeira e tal... (que) não era comprometido com a região", afirma o presidente do Sindicato Rural, Murilo Zancaner.
Pecuária de precisão
Mauro Lúcio Costa é
dono de 4.356 mil hectares e tem 80% da fazenda preservada. Cerca de 880
hectares foram desmatados e 480, usados para pecuária de corte.
Segundo ele, para
evitar a abertura de novas áreas, o desafio era engordar cada vez mais bois,
utilizando o mesmo espaço. Então, ele resolveu investir nas pastagens.
Enquanto a média
brasileira é de uma cabeça de gado por hectare, o pecuarista consegue quase 4
animais por hectares o ano inteiro. "Quanto mais você aumenta a taxa de
lotação, mais você reduz os custos fixos", explica.
Além disso, todo o
processo de engorda é rigorosamente controlado e tabelado. É a chamada pecuária
de precisão, onde os animais são vistos, pesados, avaliados e cadastrados
individualmente.
Minimizar impactos
Mauro Lúcio Costa
também faz a restauração das áreas degradadas da fazenda. Entre um piquete e
outro plantou bosques com espécies nativas da Amazônia e exóticas, como o mogno
africano.
"Minha ideia
nisso daqui é minimizar o impacto da minha atividade dentro da
biodiversidade", afirma.
O pecuarista afirma
que não espera receber mais pela carne por causa do trabalho de preservação.
"Ninguém vai me pagar por preservar, ninguém paga os outros por andar na lei. Eu querer receber por uma floresta que a legislação me obriga a ter é utopia", afirma Costa.
“O que eu acho que
eu devo fazer é eu ter a floresta que eu tenho, ela servir, ir no rótulo do meu
produto como ecologicamente correto, como um produto que respeita o meio
ambiente, aí eu teria uma abertura maior de mercado”, explica.
Carbono neutro
A 50 quilômetros da
propriedade de Mauro Lúcio Costa, mais um exemplo de produção sustentável na
Amazônia. A propriedade visitada faz parte de um seleto grupo de dez fazendas
escolhidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa)
para sediar a pesquisa de carbono neutro no Brasil.
O motivo é que o
gás metano, nocivo à atmosfera, é formado no processo digestivo dos bovinos,
lançado na atmosfera pelo arroto. A pesquisa mostrou que capins ricos em fibras
e nutrientes diminuem a formação de metano.
Associado a isso,
há também o plantio de corredores de floresta a cada 25 metros nos piquetes,
assim os animais podem usar a sombra para se abrigar do sol, gerando conforto
térmico.
O estudo mostrou
que o gado criado nessas condições têm ganho de até 20% a mais na produção de
carne em relação aos animais que ficam em áreas desprotegidas.
Sem derrubar árvores
Quem administra a
fazenda onde ocorre a pesquisa de carbono neutro é a produtora rural Berenice
Bueno, de 27 anos. A propriedade tem 5 mil hectares preservados. Ela afirma que
não é preciso derrubar mais nenhuma árvore para aumentar a produção da fazenda.
O pesquisador da
Embrapa Adriano Venturieri explica que é possível utilizar apenas as áreas que
já existem para uma pecuária produtiva.
"É muito mais
vantagem o produtor recuperar essa área usando tecnologia, sem a utilização do
fogo, com isso ele vai ter uma área muito mais produtiva", diz.
Na Amazônia,
existem mais de 10 milhões de hectares de pastagens degradadas, uma área maior
que o estado de Pernambuco inteiro, que poderia ser recuperada por tecnologia
que já existe.
Segundo
estimativas, o Brasil tem entre 60 e 100 milhões de hectares cobertos com
pastagens degradas, ou seja, a pecuária tem muita área disponível para crescer,
sem derrubar uma árvore sequer.
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